2013

Tempo e acontecimento

por Oswaldo Giacoia Junior

Resumo

O tempo é o horizonte do acontecimento. É na intersecção entre eles que pode-se fazer, no presente, uma decisiva experiência do sentido, das relações entre o ser, o pensamento e o discurso. De acordo com uma interpretação de Michel Foucault, quando Kant formulou a resposta à pergunta: o que é Esclarecimento?, com ela respondeu também a questão a respeito do sentido do seu tempo. Para fazê-lo, Kant precisava de um acontecimento que, no presente, tivesse a função de signo diagnóstico, retrospectivo e prospectivo, permitindo ascultar algo essencial no destino histórico da humanidade – um acontecimento que fosse também sinal dos tempos. Esse acontecimento era, em essência, um grande pensamento: a ideia de uma constituição jurídica republicana, que proscreve a guerra ofensiva. Esse pensamento, universalmente compartilhado no registro humano afetivo do entusiasmo foi a medula espiritual que transformou a Revolução Francesa no ícone da modernidade cultural e política.

É sempre na temporalidade própria do acontecimento que emergem os signos de um processo no qual o pensamento, a filosofia e o conhecimento são concernidos no mais alto grau, pois nesse movimento aquele que se dispõe a pensar o que acontece no seu próprio tempo não pode deixar de estar como que ‘entusiasmado’, na medida em que ele mesmo faz parte do processo que descreve e sobre o qual medita. Muito mais do que isso – como pensador, ele tem um papel a desempenhar nesse processo, no qual ele se encontra, portanto, implicado, tanto como elemento, quanto como ator e protagonista.

Por causa disso, impõe-se pensar agora a intersecção entre tempo e acontecimento, na medida em que nessa encruzilhada fazemos uma radical experiência da historicidade do universal; pois a Europa, e os países sob sua influência, são a região determinada do mundo, onde, numa época determinada da história, produziu-se o acontecimento decisivo, que ainda hoje define o perfil de nossa identidade, que talvez já deixe entrever os primeiros indícios de sua profunda transformação.

Para Foucault, “ a Europa é o lugar de nascimento da universalidade.” Por causa disso, completa: “a crise do pensamento europeu atrai a atenção de todo o mundo e ela concerne o mundo inteiro. É uma crise que influencia os diferentes pensamentos de todos os países do mundo, assim como o pensamento geral do mundo”.

É com essa mesma crise que continuamos comprometidos na medida em que ainda exige de nós o máximo empenho de atividade intelectual e ação política. Nesse horizonte, a filosofia como exercício, ensaio, tentativa, faz um esforço para discernir os signos de uma silenciosa mutação em curso, as primícias do acontecimento que se anuncia para um pensamento a vir.


O tempo é a substância do acontecimento. É na intersecção entre tempo e acontecimento que se pode fazer, no presente, uma decisiva experiência do sentido. O acontecimento é um topos central da ontologia fundamental de Martin Heidegger, um de seus mais persistentes problemas; enquanto também uma produtiva contribuição para a filosofia contemporânea, de modo que a referência a Heidegger, nesse campo de questões, significa muito mais do que um tributo à erudição e à necessidade de citar autores incontornáveis – ao contrário, o conteúdo espiritual da noção heideggeriana de acontecimento constitui o desafio mais importante para a tarefa atual do pensamento. Com seu conceito de acontecimento, Heidegger não pretende identificar nem situar um evento no âmbito dos fatos que marcam o tempo cronológico; o acontecimento não pode ser suficientemente perscrutado no quadro teórico da historiografia. E, no entanto, a história (Geschichte) no sentido em que a entende Heidegger, só pode ser meditada em relação ao acontecimento, mais precisamente, ao acontecer (Geschehen), pensado como remessa/ envio (Geschick) e, no vetor dessa mediação, também como destino e destinamento (Schicksal).

Pensar o acontecimento é colocar-se no caminho que, sulcado no presente, reata com o passado originário da experiência cultural que nos constitui, bem como descerra a perspectiva futura de nossa destinação. A diretriz para pensar o acontecimento, em toda sua envergadura, não é unidimensional, mas perfaz a circularidade hermenêutica, retornando às raízes gregas do logos filosófico, para resgatar o acontecimento memorável que marca simultaneamente instituição da e do Ocidente. O neologismo historial ou destinamental (geschichtlich, geschicklich) conota o acontecimento como o elemento que determina o sentido (em acepção vetorial) que adquire uma era do tempo ou uma figura do mundo. Assim, não se pode tomar como idêntica a acontecimento, em nossos dias, a programação tecnológico-genético-industrial que disponibiliza a produção e reprodução de organismos humanos machos e fêmeas, estocáveis de acordo com as exigências de planejamento das respectivas demandas.

Acontecimento é, antes, a experiência historial do sentido do ser como presentidade (Vorhandenheit), que prepara metafisicamente a disponibilização de todos os entes, na condição de fundo de reserva de energias, preparado para a permanente “mobilização total”, ou seja, para sua instrumentalização no cálculo estratégico, no circuito tecnológico da extração/ exploração, transformação, distribuição, comutação, consumo e reprodução reiterativa do ciclo que realiza tecnologicamente a figura do mundo como vontade de poder e eterno retorno do mesmo, a transformação contemporânea da metafísica em cibernética.

Pensar o acontecimento implica recuperar o sentido do nosso tempo, posto que esse acontecimento é o que determina sua verdade, na acepção do elemento que lhe é mais essencial e próprio (eigentlich). É isso que Heidegger nomeia com a palavra Ereignis – acontecimento apropriador. Apropriador porque descobre (alétheia) ipsissimum do tempo histórico no interior do qual fomos e somos constituídos – uma experiência histórica da Verdade do Ser como presentidade, que está na raiz da metafísica grega, ou seja, da história da filosofia e da cultura europeia, o que significa, hoje em dia, o Ocidente em escala planetária.

Apropriador também porque retomá-lo pelo pensar [aliás, a única possibilidade de fazê-lo] é também o caminho para a superação de nossa alienação e apatridade, de recuperação da Verdade de nosso próprio tempo (ontologia do presente), mas também da essência originária do Dasein como correspondência ao Ser, que doa a dádiva do acontecimento. História da verdade do Ser é um título que se aplica com tanto acerto ao Heidegger de Tempo e Ser como analítica existencial ou ontologia fundamental aplicam-se a Ser e Tempo.

Convém atentar, porém, para o fato de que a palavra “história” traduz tanto Geschichte (do verbo geschehen, acontecer; ao qual remetem os aparentados Schicht: camada, extrato, e Schickung: envio, destinamento) quanto a derivação latina germanizada de Historie. Esta última é a história como disciplina científica, a historiografia dos historiadores – registro cronológico objetivo de séries de acontecimentos, causalmente ordenados, com suas circunstâncias, condições determinantes, fatores causais e consequências de ordens variadas (econômicas, políticas, sociais, culturais, por exemplo). Por sua vez, Geschichte designa o acontecer adventício, os acontecimentos singulares que impregnam a configuração e determinam o sentido de uma era do mundo. Com apoio no termo Geschick (o que é enviado, destinado, concluído com êxito e propriedade), Heidegger denomina tais eventos “destinação'” ou acontecimento “destinamental”, para cuja tradução os franceses empregam o termo événementiel: o que ocorre e tem importância para os homens.

O substantivo Geschick e o verbo schicken significam, pois, enviar, remeter, dispor numa ordem, instalar – as duas últimas acepções derivadas da ligação de schicken respectivamente com os verbos anordnen einrichten; do mesmo étimo deriva o substantivo Schicksal (destino). Nesse circuito, Geschichte remete a Geschehnis (acontecer, acontecido) e Ereignis (acontecimento apropriador, evento pregnante, que confere a um tempo do mundo [Zeitalter] a marca de sua figura). O signo desse acontecer não é o tempo como Kronos, nem é a finitude (Zeitlichkeit) própria do Ser-O-Aí, mas o que Heidegger denomina de temporaneidade do Ser. É nela que o Ser se dá e se mostra no horizonte da história, que sua verdade (alétheia) vige como acontecimento apropriador (Ereignis).

A palavra Ereignis remete a um extrato profundo do idioma alemão; Ereignis deriva do gótico áugan, e do Mhd[1]Ougen (auge, Auge), de onde provêm ereugen, er-äugen, er-blicken, “im Blicken zu sich rufen, an-eignen” (trazer à vista, apropriar-se). Para manter essa ressonância traduzo Ereignis por acontecimento apropriador, designando um advento que vinca uma época da história, confere a ela uma cunhagem própria e essencial (Eigenschaft), um sentido no qual os entes, em sua totalidade, são acolhidos no mundo humano. O acontecimento apropriador confere direção a uma era do mundo (Weltgeschick), pensada como um destinamento, um desocultamento da essência dos entes em sua verdade (alétheia). É nessa acepção que Heidegger interpreta a metafisica como história do Ser ou, antes, como história do esquecimento da verdade do Ser.[2]

Desde Platão, por exemplo, a precedência da ideia (essência ou forma inteligível) sobre os entes sensíveis traz consigo, na forma do eidos, ti estin (o que é) em lugar do Ser, de modo que, antes de tudo, Ser é Ser-algo (Wassein). Ser como Ser-algo (a ideia como ontós ón) proporciona aos entes mais espaço que ao próprio Ser. “O privilégio do Ser-algo traz consigo a precedência do próprio ente a cada vez naquilo que ele é. A precedência do ente fixa o Ser como o koinón a partir do én. Está decidido o caráter distintivo da metafísica. O Uno como a unidade unificadora toma-se determinante para a destinação posterior do ser”[3].

Na filosofia moderna, a verdade do Ser dos entes passa a identificar-se com a certeza da representação, de modo que o hypokeimenon (substrato) se transforma em subjectum; e a verdade, de correspondência entre o intelecto e as coisas, toma-se a clareza e a distinção das percepções. Representar é a unidade unificadora dos entes em sua verdade. Descartes é o pensador que preconiza a transformação metafisica na essência da verdade, cabendo a Kant a reconstrução da ontologia em seu programa de filosofia transcendental. Leibniz, no caminho entre Descartes e Kant, ao conceber o Ser dos entes como mônada, pensada como perceptio (pensamento) e apetitus (vontade), prepara a transição para o conceito de Absoluto em Schelling, Hegel e finalmente a identificação da vontade de poder em Nietzsche como essência do mundo.

Como história do esquecimento da pergunta pelo sentido do Ser, a metafisica ingressa com Nietzsche na era de seu acabamento: a vontade de poder torna-se essência metafísica do mundo, e o eterno retorno é o modo de existência que lhe é próprio. A relevância atribuída por Heidegger à expressão coloquial “Es gibt” (existe, há; literalmente isso dá, isso doa) explicita-se nesse contexto. Na linguagem cotidiana, é corrente a associação entre existir/ acontecer, e dar/ doar. O pronome impessoal “Es” remete ao Ser como sujeito da ação verbal: isso (es) dá (gibt); isso é o Ser; aquilo que ele doa é a si mesmo, na medida em que ele dá existência (há, existe, o ente); esse dar é, portanto, um dar-se do Ser, um abrir-se possibilitador do desvelamento dos entes em sua verdade, no vigor da essência que lhes é própria.

A dádiva acontece na temporalidade própria do Ser, que não é o tempo linear e cronológico dos relógios, nem causalidade da história dos historiadores, mas o acontecer que irrompe do desvelar-se (alétheia) do Ser. O Ser é abertura e vazio – Es gibt Seiendes: os entes são, existem -, são modo de envios do Ser, sempre no horizonte temporal de um acontecimento apropriador, como a essência metafísica da técnica moderna, por exemplo. Um aberto, uma clareira onde os entes vêm à luz em sua verdade. A técnica é, essencialmente, um modo de trazer à luz, de produzir, cuja origem, essência e destinação estão ligadas a producere, hervorbringen, poiésis, que são camadas ou extratos na temporalidade em que se inscreve a história da verdade (alétheia, desocultamento) do Ser.

O que diz Heidegger, finalmente, “sobre” o Ser? Na medida em que “acontecimento apropriador” (“Ereignis”) é, desde 1936, sua “palavra-chave”, essa pergunta tem de ser precisada: Como compreende ele o acontecimento apropriador? Heidegger destaca, com toda a clareza, que, como palavra-chave de seu pensamento, o termo “acontecimento apropriador” não compreende mais aquilo que se costuma denominar acontecer (acontecimento, diz Heidegger), evento, e termos que tais. Ele aponta para o que essa palavra originalmente significa: er-iiugen (trazer diante dos olhos), isso significa mirar, trazer a si diante da vista, apropriar-se. Depreende-se de seus ulteriores esclarecimentos que ele interpreta “acontecimento apropriador” apenas a partir da palavra eigen (próprio). Mais adiante, ele compreende “acontecimento apropriador” unicamente como singulare tantum[4].

Esse é o sentido das imagens poéticas às quais Heidegger liga tais noções: linguagem (lógos), em sua determinação (Bestimmung), é desvelamento. Metaforicamente, ela pode figurar como a clareira, em que se mostra a essência dos entes, que se tornam fenômenos para o Dasein, seu curador. A linguagem é, portanto, a “casa do Ser”, e o homem é o ente que habita po(i)eticamente essa morada. Ex-sistir é corresponder linguageiramente a esse chamamento do Ser, ao descerrar-se do Ser aos entes em seu desocultar. O Ser acontece em seus adventos, mas não se confunde com eles; para que haja um desvelar- uma alétheia-, é primeiro necessário um estar oculto, não há desvelo sem velamento anterior. Nada é doado que antes não se tenha subtraído. Nesse sentido, há que se pensar uma interpenetração entre Ser e Nada – Ser é nada de ente, nenhuma entidade da qual se possa predicar uma propriedade qualquer; é antes um vazio, o imponderável a partir do qual vem a ser até mesmo o gesto mais fugaz. O Ser desvela os entes no modo de ser que é próprio deles, ao mesmo tempo em que se subtrai, furta-se tanto ao desvelamento quanto ao que nele é desvelado.

PENSAR A ESSÊNCIA DA TÉCNICA

Pensada na chave do acontecimento, a técnica moderna é desvelamento e produção. Trata-se de um trazer à luz, um pôr e dispor, um tornar manifesto, que tem a “forma do desafio (Herausforderung), que estabelece para a natureza a exigência de fornecer energia suscetível de ser extraída e armazenada enquanto tal”[5]. Como modo da poiesis, a técnica moderna dispõe os entes como objetos num processo reiterativo formado por extração, transformação, preparação, armazenamento, distribuição, comutação, consumo, desgaste: numa circularidade sem começo nem fim.

O ar é posto para o fornecimento de nitrogênio, o solo para o fornecimento de minérios, o minério, por exemplo, para a produção de energia atômica, que pode ser associada ao emprego pacífico ou à destruição[…] A central hidrelétrica está posta no rio Reno. Ela põe o Reno em função da pressão de suas águas, fazendo com que, desse modo, girem as turbinas, cujo girar faz com que funcionem as má­ quinas que geram energia elétrica para a qual estão preparadas as centrais interurbanas e sua rede de energia demandada para a transmissão de energia. No âmbito das consequências interconectadas da demanda de energia elétrica, o rio Reno também aparece como algo demandado. A central elétrica não está construída no rio Reno, como a antiga ponte de madeira, que há séculos une uma margem à outra. Antes e pelo contrário, é o rio que está construído na hidrelétrica. O desocultar que domina a técnica moderna tem o caráter do pôr no sentido do desafio. Este acontece pelo fato de a energia oculta na natureza ser explorada, do explorado ser transformado, do transformado ser armazenado, do armazenado ser novamente distribuído e do distribuído ser renovadamente comutado. Explorar, transformar, armazenar e distribuir são modos do desocultar[6].

A essência da técnica mostra-se na instalação dos entes como variáveis de cálculo no processo circular acima descrito. A esse conjunto Heidegger denomina Gestell – armação ou dispositivo. A essência da técnica moderna consiste na subsistência assegurada das condições de reiteração permanente do dispositivo de produção, armazenamento, distribuição, comutação e desgaste. ”A palavra ‘subsistente-estoque’ (‘Bestand’) ingressa agora na posição de um título. Designa nada menos que o modo que vige tudo aquilo que é tocado pelo desocultar desafiador”[7].

novum na técnica moderna consiste num desafiar que instala a natureza na condição de manancial de energia suscetível de ser extraída, armazenada, distribuída e renovadamente comutada, de modo que o essencial não é o resultado objetivo determinado desse processo, mas antes a dinâmica e a lógica imanentes do próprio processo de conversão em estoque armazenável e permanentemente comutável. A configuração atual de nossas sociedades depende essencialmente da atualização do potencial tecnológico, este constitui a mais determinante força produtiva em nossas sociedades. A verdade da metafísica moderna é o domínio planetário da cibernética, a exploração tecnológica das galáxias.

GESCHICK (DESTINAMENTO) E GEFAHR (PERIGO)

Em sua acepção originária, a técnica é uma modalidade de producere, de her-vor-bringen – de trazer à luz, desvelar, desocultar -, acepções que não correspondem às noções correntes da técnica como meio para um fim (concepção instrumental), ou como incremento do poder fazer humano (concepção antropológica).

Se, portanto, o homem, ao pesquisar e observar, persegue a natureza enquanto uma região de seu representar, então ele já é convocado por um modo de desabrigamento que o desafia a ir ao encontro da natureza enquanto um objeto de pesquisa, até que também o objeto desapareça na ausência de objeto da subsistência. Assim, a técnica moderna, enquanto desabrigar que requer, não é um mero fazer humano. Por isso, devemos também tomar aquele desafiar, posto pelo homem para requerer o real enquanto subsistência tal como se mostra. Aquele desafiar reúne o homem no requerer. Isto que é reunido concentra o homem para requerer o real enquanto subsistência […] Denominamos agora aquela invocação desafiadora que reúne o homem a requerer o que se descobre enquanto subsistência de armação (Ge-stell), como fabricação[8].

Para Heidegger a técnica não é meio, nem instrumento posto a serviço do homem – pelo contrário, ela traz à tona a determinação própria do homem moderno, como requisitado e determinado a ser pelo modo de desabrigar que constitui a essência da técnica como desafio; o homem moderno é convocado para desafiar e explorar a natureza como reserva de energia. A respeito da essência da técnica, observa Heidegger,

muito se escreve, mas pouco se pensa. A técnica é, em sua essência, um destinamento ontológico-historial, um desvelamento (alétheia) do Ser, que, enquanto tal, tanto se oferece quanto se subtrai, em sua verdade. A técnica não remonta, na verdade, apenas com seu nome, até a tékne dos gregos, mas ela se origina ontológico-historialmente da tékne como um modo do alethúein, isto é, do tornar manifesto o ente. Enquanto uma forma da verdade, a técnica se funda na história da metafísica. Esta é uma fase privilegiada da história do ser e a única da qual, até agora, podemos ter uma visão de conjunto[9].

Ora, se história da metafísica é também a história do esquecimento do ser e de sua substituição pelo ente, só um pensamento que ultrapassou a metafísica pode abrir-se para a rememoração do sentido do ser e, portanto, para pensar originariamente a essência da técnica como uma destinação (Geschick) na história da verdade do ser. Justamente disso o humanismo, em qualquer de suas modalidades, é incapaz, pois ele é essencialmente metafísico e, portanto, só compreende a técnica em chave antropológica e instrumental, ou, dito modernamente, como vontade de poder, isto é, como potencialização da capacidade humana de produzir. Consuma-se com Nietzsche o acabamento da metafísica; esta se realiza historicamente como instalação de todos os entes nos circuitos tecnológicos de produção, consumo e desgaste. Essa objetivação técnico-científica da natureza engloba tudo num único processo de fabricação e desgaste, que tudo reduz à condição de variável de cálculo: ”Agricultura é agora indústria alimentar motorizada; em essência, o mesmo que a fabricação de cadáveres em câmaras de gás[…] o mesmo que a fabricação de bombas de hidrogênio”[10].

Em condições tais, o humanismo não seria uma alternativa para a metafísica, na medida em que concebe a natureza humana a partir das categorias metafísicas de substância e acidente, gênero próximo (animal) e diferença específica (racional). Daí decorre, para Heidegger, que

todo humanismo ou funda-se numa metafísica, ou ele mesmo se postula como fundamento de uma tal. Toda determinação da essência do homem que já pressupõe a interpretação do ente, sem a questão da verdade do ser, e o faz sabendo ou não sabendo, é metafísica. Por isso, mostra-se, e isto no tocante ao modo como é determinada a essência do homem, o elemento mais próprio de toda metafísica, no fato de ser “humanística”. De acordo com isso, qualquer humanismo permanece metafísico[11].

Ora, contando com seus próprios recursos categoriais, nenhuma metafísica, seja ela idealista, cristã, ateísta ou materialista, pode “atingir e reunir, através do pensar, o que agora é do ser, num sentido pleno”[12]. E assim, a despeito de suas “boas intenções”, o humanismo contemporâneo dá seguimento à completa objetivação da natureza, transmudando a essência e a destinação do homem, que, de “pastor do ser”, preocupado com o cuidado dos entes, tornou-se a “mais importante matéria-prima” a ser consumida no desgaste (Vernutzung) universal do ente.

Quando tiver êxito o domínio da energia atômica, e este êxito ocorrerá, então se iniciará um desenvolvimento totalmente novo do mundo técnico. O que conhecemos hoje como técnica cinematográfica e televisiva, como técnica de transportes, das comunicações, como técnica médica e de nutrição, representa, supostamente, apenas um estágio inicial e grosseiro. Ninguém pode saber as reviravoltas que estão por vir. Enquanto isso, o desenvolvimento da técnica se dará em um curso cada vez mais rápido e não poderá ser detido em parte alguma[13].

O credo antropocêntrico e humanista é uma ilusão ingênua e perigosa, pois concebe a tecnologia como instrumento à disposição e controle da racionalidade humana. Para Heidegger, “nenhum indivíduo, nenhum grupo humano, nenhuma comissão de relevantes estadistas, pesquisadores ou técnicos, nenhuma conferência de dirigentes da economia e da indústria consegue frear ou direcionar o curso histórico da época atômica. Tudo se passa como se o homem de hoje, em face do pensamento meramente calculatório, renunciasse a inserir o pensamento meditativo num papel determinante”[14]. Heidegger confia na potência silenciosa da meditação: embora não tenha a mesma eficácia instrumental do pensar calculatório, a meditação preocupada não deixa de ser determinante, nem se esgota em reverência ao fato; a palavra serenidade não é sinônimo de resignação. Com ela, Heidegger pensa um agir amadurecido, liberado da insânia compulsiva do ativismo, do falatório vazio e pomposo vigente na esfera pública contemporânea:

Não é por ele irradiar um efeito ou por ser aplicado que o pensar se transforma em ação. O pensar age enquanto se exerce como pensar. Este agir é provavelmente o mais singelo e, ao mesmo tempo, o mais elevado, porque interessa à relação do ser com o homem. Toda eficácia, porém, funda-se no ser e se espraia sobre o ente. O pensar, pelo contrário, deixa-se requisitar pelo ser para dizer a verdade do ser. O pensar consuma este deixar. Pensar é l’engagement par l’Être pour l’Être. Ignoro se, do ponto de vista linguístico, é possível dizer ambas as coisas (“par” e “pour”) numa só expressão, a saber: penser c’est l’engagement de l’Être. Aqui, a palavra para o genitivo de l’ […] visa a expressar que o genitivo é ao mesmo tempo genitivus subjectivus e objectivus[15].

Em plena hegemonia do sentido instrumental e antropocêntrico da técnica, o progresso tecnológico compulsivo subverte a lógica da ética humanista. As pesquisas biogenéticas instrumentalizam a base somática da personalidade, tornando-a disponível para fins incompatíveis com o ethos que, até aqui, constituiria o espaço de habitação do homem no mundo, o horizonte de sua autocompreensão. Fantasias estéticas narcisistas sobre o consumo mercantil do homem seriam uma réplica cínica da Vernutzung (desgaste) do “material humano”.

Como afirma Heidegger, num tempo em que a tecnologia, cuja essência é armação (Ge-stell), exerce um domínio planetário, aí também espreita um perigo (Gefahr). Mas é justamente à sombra do perigo que urge retomar as palavras dos poetas e pensadores, da arte e da filosofia. Nesse caso específico, a poesia de Hölderlin: “Wo aber Gefahr ist, wiichst das Rettende auch” (Lá onde há perigo, cresce também aquilo que salva)[16]. À dicção do poeta, Heidegger acrescenta uma palavra de filósofo: serenidade. Não um lamento, uma demonização da tecnologia; ao contrário, ele prenuncia uma relação pensante com o segredo até hoje velado na essência da técnica. A palavra de Heidegger diz: serenidade para com as coisas, cuidado preocupado com o mundo, deixar ser, abertura para o segredo – ethos de meditação sobre os destinamentos do Ser, nascidos de um pensamento que é, em si mesmo, ação. “Se crescem em nós a serenidade para com as coisas e a abertura para o segredo, então nos é lícito chegar a um caminho que conduz a um novo fundamento (Grund) e solo. Nesse solo, o criar de obras que permanecem pode fincar novas raízes”[17].

Considero que devemos levar muito a sério o depoimento de Michel Foucault, que faz de Heidegger um acontecimento decisivo em sua vida. “Todo o meu devir filosófico foi determinado por minha leitura de Heidegger; é importante ter um pequeno número de autores com os quais se pensa, com os quais se trabalha, mas sobre os quais ‘não se escreve’ e que se constituem em ‘instrumentos de pensamento”‘[18]. Pensar o acontecimento seria prestar ouvidos ao que Foucault nos ensina sobre o que significa essa tarefa, bem como sobre como e quanto sua realização remete às lições da ontologia fundamental de Heidegger. Para Foucault, o acontecimento é fundamentalmente aquilo que não se pode mais esquecer.

De acordo com uma genial interpretação de Foucault, quando Kant formulou a resposta à pergunta: O que é Esclarecimento?, ele respondeu também à questão a respeito do sentido do presente. Para fazê-lo, Kant carecia de um acontecimento ou evento com função de signo diagnóstico, retrospectivo e prospectivo – permitindo auscultar algo essencial no destino histórico da humanidade; portanto, um acontecimento que fosse também um sinal dos tempos. Acontecimento que era, em essência, um grande pensamento: a ideia de uma constituição jurídica republicana, que proscreve a guerra ofensiva. Esse pensamento, universalmente compartilhado no registro humano afetivo do entusiasmo, é a medula espiritual que transforma a Revolução Francesa no ícone da modernidade cultural e política.

Esse advento com valor de signo não se confunde com o fato bruto e ruidoso da reviravolta dos poderes, com as catástrofes pelas quais perecem os Estados, enfim, com a sangrenta reviravolta, em grande estilo, das estruturas da sociedade e do Estado. É o entusiasmo pela ideia de uma constituição jurídica auto outorgada que constitui o acontecimento revolucionário e o sinal dos tempos modernos. Como Nietzsche reconhecerá mais tarde: ”As palavras mais quietas são as que trazem a tempestade. Pensamentos que vêm com pés de pomba dirigem o mundo”[19].

Todos os acontecimentos decisivos não são tagarelas, eles acontecem nas horas de maior silêncio.

Os maiores acontecimentos e pensamentos – mas os maiores pensamentos são os maiores acontecimentos – são os últimos a serem compreendidos: as gerações que vivem no seu tempo não vivenciam tais acontecimentos – elas passam ao largo deles. Ocorre algo semelhante no reino das estrelas. A luz das estrelas mais distantes é a última a chegar aos homens; e, enquanto ela não chega, os homens negam que ali haja estrelas[20].

É sempre na temporalidade própria do acontecimento que advêm os signos de um processo no qual o pensamento, a filosofia e o conhecimento são concernidos ao mais alto grau, pois nesse movimento aquele que se dispõe a pensar o que acontece no seu próprio tempo não pode deixar de estar como que “entusiasmado”, na medida em que ele mesmo faz parte do processo que descreve e sobre o qual medita. Muito mais do que isso – como pensador, ele tem um papel a desempenhar nesse processo, no qual ele se encontra, portanto, implicado, tanto como elemento quanto como ator e protagonista.

Por causa disso, impõe-se pensar agora a intersecção entre tempo e acontecimento, na medida em que nessa encruzilhada fazemos nós, herdeiros dos bons europeus da época das Luzes, uma radical experiência da historicidade do universal; pois a Europa é uma região determinada do mundo, na qual, numa época determinada da história, produziu-se o acontecimento decisivo que ainda hoje determina o perfil de nossa identidade, assim como oferece os primeiros indícios daquilo que talvez estejamos a ponto de deixar de ser.

A Europa “apresenta a particularidade de criar uma categoria universal que caracteriza o mundo moderno. A Europa é o lugar de nascimento da universalidade”[21]. É em vista dessa historicidade do universal, sobretudo em face da crise atual e permanente dos conceitos ocidentais de revolução, de homem, de sociedade e de política, que se repõe para nós a tarefa de detectar os eventuais signos diagnósticos e premonitórios dos tempos.

Porque é na Europa que se institui um quadro categorial de universalidade que é teoricamente estruturante para o mundo moderno; porque a Europa figura, portanto, historicamente como o lugar de nascimento da universalidade, tal como a conhecemos,

a crise do pensamento europeu atrai a atenção de todo o mundo e ela concerne ao mundo inteiro. É uma crise que influencia os diferentes pensamentos de todos os países do mundo, assim como o pensamento geral do mundo. Por exemplo, o marxismo nasceu numa época determinada, numa região determinada: ele foi fundado por judeus por meio de contatos com um punhado de operários. Isso se tornou não apenas uma forma ideológica, mas uma visão de mundo, uma organização social […] Ora, o marxismo encontra-se atualmente em uma crise indiscutível: a crise do pensamento ocidental, a crise do conceito ocidental que é a revolução, a crise do conceito ocidental que são o homem e a sociedade. É uma crise que concerne ao mundo inteiro, e que concerne tanto à União Soviética como ao Brasil, à Tchecoslováquia[22].

É com essa mesma crise que continuamos comprometidos, nela permanecendo enredados, na medida em que ainda exige de nós o máximo empenho de atividade intelectual e ação política. Nesse horizonte, a filosofia como exercício, ensaio, tentativa, faz um esforço para discernir os signos de uma silenciosa mutação em curso, as primícias do acontecimento que se anuncia para um pensamento a vir.

Na obra A arqueologia do saber, Michel Foucault tematiza a relação entre o tempo e o acontecimento no horizonte descerrado entre “a língua, que define o sistema de construção das frases possíveis, e o corpus, que recolhe passivamente as palavras pronunciadas”, problematizando a singularidade dos acontecimentos por meio do conceito de arquivo: este deve ser situado no registro de uma prática discursiva, aquele de

uma prática que faz surgir uma multiplicidade de enunciados como tantos acontecimentos regulares, como tantas coisas oferecidas ao tratamento e à manipulação. Não tem o peso da tradição; não constitui a biblioteca sem tempo nem lugar de todas as bibliotecas, mas não é, tampouco, o esquecimento acolhedor que abre a qualquer palavra nova o campo de exercício de sua liberdade; entre a tradição e o esquecimento, ela faz aparecer as regras de uma prática que permite aos enunciados subsistirem e ao mesmo tempo se modificarem regularmente. É o sistema geral da formação e da transformação dos enunciados[23].

Nessa acepção, o arquivo é a lei de o que pode ser dito numa determinada sociedade, numa certa época de sua história, é o sistema que rege o surgimento dos enunciados possíveis, que se efetuam como o que Foucault denomina de acontecimentos singulares:

É evidente que não se pode descrever exaustivamente o arquivo de uma sociedade, de uma cultura ou de uma civilização; nem mesmo, sem dúvida, o arquivo de uma época. Por outro lado, não nos é possível descrever nosso próprio arquivo, já que é no interior de suas regras que falamos, já que é ele que dá ao que podemos dizer – e a ele próprio, objeto de nosso discurso – seus modos de aparecimento, suas formas de existência e de coexistência, seu sistema de acúmulo, de historicidade e desaparecimento. O arquivo não é descritível em sua totalidade e é

incontornável em sua atualidade[24].

A arqueologia praticada por Foucault pode ser caracterizada como a descrição dos discursos em sua positividade de práticas especificadas pela lei do arquivo, considerado como o sistema geral de relações entre o dito e o não dito. Considerado em seu estatuto e função, o arquivo é o elemento em cujo âmbito são pronunciados, fixados, transformados, acumulados e conservados os enunciados que determinam o conjunto do saber de uma sociedade, numa certa época; que determinam, portanto, tanto os objetos e conceitos como os métodos, regras e procedimentos para sua apreensão, bem como o sujeito desses saberes, do ponto de vista da função que ele desempenha na produção de enunciados, ou seja, a função enunciativa do sujeito na linguagem.

Por essa razão, o acontecimento, em suas coordenadas espaciais e temporais, produz-se, reproduz-se, transmite-se, modifica-se e se conserva no elemento do arquivo, que é o campo próprio da atualidade do que se pode saber e dizer. Nesse sentido, não podemos descrever nosso próprio arquivo, já que é nele que podemos pensar e dizer o que conhecemos e falamos. Por causa disso, quando nos perguntamos pela nossa atualidade, é porque já principiamos a deixar de ser quem somos, é porque, de certo modo, já nos encontramos em processo de mutação. É em virtude disso que Foucault encerra a introdução à sua Arqueologia do saber com um fulminante exercício de ironia filosófica, que coloca em questão o acontecimento de sua própria obra:

Acredita que eu me teria obstinado, cabeça baixa, se eu não preparasse – com as mãos um pouco febris – o labirinto onde me aventurar, deslocar meu propósito, abrir-lhe subterrâneos, enterrá-lo longe dele mesmo, encontrar-lhe desvios que resumem e deformam seu percurso, onde me perder, e aparecer finalmente diante de olhos que eu não teria mais de encontrar. Mais de um, como eu sem dúvida, escreveu para não ter mais fisionomia. Não me pergunte quem sou eu e não me diga para permanecer o mesmo: é uma moral de estado civil; ela rege nossos papéis. Que ela nos deixe livres q anto se trata de escrever[25].

Próximo do final precoce de sua vida, Michel Foucault retoma, num horizonte filosófico algo modificado, sua preocupação obsessiva com o acontecimento e o sentido do presente. Ele se pergunta pelo elemento que define a atualidade, o campo acontecimental e atual das experiências possíveis, numa tentativa de fazer uma ontologia do presente, uma “ontologia de nós mesmos”. O que é a atualidade, pergunta-se então Foucault, e ao fazê-lo toma o conceito de acontecimento como fio de Ariadne para penetrar no labirinto de problemas que definem a nossa atualidade. É em relação ao acontecimento que Kant ressurge como pensador decisivo, tal como já ocorrera no início da carreira filosófica de Michel Foucault, cuja tese doutoral complementar foi justamente a célebre antropologia escrita desde o ponto de vista pragmático por Immanuel Kant, cuja pergunta cardinal é: O que o homem, como ser moral, pode fazer de si mesmo ao longo de sua história?

Em Un cours inedit, Foucault inicia sua problematização retomando a resposta dada por Kant à pergunta: O que é Esclarecimento?[26], para mostrar que a peculiaridade de Kant, nesse opúsculo publicado em 1784, não consiste apenas em colocar questões atinentes à história, ou à filosofia da história – o que já fizera em textos anteriores -, mas em haver formulado, pela primeira vez na história do Ocidente, um certo tipo de questionamento a respeito do presente e do acontecimento, num gesto teórico que toma a seu cargo seu próprio presente, para transformá-lo em problema filosófico.

De acordo com a interpretação de Foucault, em Resposta à pergunta: que é Esclarecimento?,a originalidade de Kant reside em ter-se esforçado por reconhecer um certo acontecimento no presente, distingui-lo, decifrá-lo entre todos os outros, na medida em que, na atualidade, ele faz sentido para a reflexão filosófica, posto que se revela como o portador e o signo de um processo que concerne ao pensamento, à filosofia e ao conhecimento. Naquele opúsculo, trata de mostrar em que e como aquele que fala – enquanto pensador – faz, ele mesmo, parte desse processo que descreve e sobre o qual medita; e – muito mais do que isso – como esse pensador tem um certo papel a desempenhar nesse processo, no qual ele se encontra, portanto, implicado tanto como elemento quanto como ator e protagonista[27].

Nesse sentido, a operação magistral de Kant teria consistido, fundamentalmente, em identificar o acontecimento cuja significação permite fazer de seu próprio presente um objeto da reflexão filosófica, perguntando-se o que é que constitui essencialmente esse presente, a respeito do qual a filosofia se questiona, ao mesmo tempo em que nele se insere. Sendo assim, se a filosofia é uma prática discursiva que tem sua própria história, então em Beantwortung der Frage: Was ist Aufklärung? a filosofia problematiza, pela primeira vez na história, sua própria prática discursiva; dirigindo-se reflexivamente à sua própria atualidade, a filosofia determina-se como tarefa enunciar o sentido desse acontecimento em que ela mesma toma parte, o valor, a singularidade filosófica, na qual ela tem de encontrar, ao mesmo tempo, sua própria razão de ser e o fundamento daquilo que ela diz.

“Esclarecimento é a saída do homem da menoridade de que ele próprio é culpado. Menoridade é a incapacidade de servir-se do próprio entendimento sem a direção de outrem”[28]. Portanto, a Aufklärung – esse processo atualmente em curso de transição progressiva do homem para sua condição de emancipação e autonomia – constitui, para Kant, a via de acesso para a resposta sobre o estatuto filosófico do presente, na medida em que constitui uma espécie privilegiada de superfície de reflexão: trata-se de um movimento, nesse presente por cuja essência se pergunta, em que está engajado o próprio pensador. Não é o caso aqui simplesmente de pertencer a uma doutrina ou tradição, nem mesmo à comunidade humana em geral, mas a um certo “nós” que se reporta a um conjunto cultural característico da atualidade: nesse movimento, a filosofia se apresenta tanto como discurso da modernidade quanto como discurso sobre a modernidade.

Isso significa que a resposta ao problema filosófico constituído pela modernidade só pode ser enunciada por parte daquele que nela está enraizado, pois o discurso filosófico tem agora de tomar em conta a própria atualidade, para nela encontrar seu lugar, ao mesmo tempo em que se encarrega de enunciar o sentido dessa atualidade, para especificar o modo de ação que ele é capaz de exercer no interior dela. Dizer o que é a Aufklärung – tomada como acontecimento que tem função de signo dos novos tempos – implica, ao mesmo tempo, abrir uma distância em relação ao próprio tempo, de certo modo deslocar-se de si, para colocar-se em condições de dizer também quem somos nós – qual é o lugar de onde falamos.

Talvez seja possível compreender melhor o problema formulando-o nos seguintes termos: ao tomar como objeto de reflexão o texto de Kant, Foucault faz dele, ao mesmo tempo, ocasião estratégica para reconstituir a genealogia não tanto da noção de modernidade, mas da modernidade como questão. Nesse sentido, Beantwortung der Frage: Was ist Aufklärung? aparece como ponto de emergência dessa questão e como fazendo parte de um processo histórico mais largo, do qual seria necessário tomar a devida medida.

Nas palavras de Foucault, a modernidade seria a primeira época da história que se autodenomina através de certo evento que concerne a ela e provém de uma história geral do pensamento, da razão e do saber; evento no interior do qual o próprio presente da filosofia desempenha certo papel, em vez de simplesmente se caracterizar como período de prosperidade ou decadência.

Fazer com que a razão filosófica se obstine na interrogação sobre o sentido do presente, no qual deita raízes o próprio pensamento que se interroga, nisso consiste a originalidade da pergunta kantiana: ela indica certo modo de filosofar que determinará os rumos da filosofia nos próximos séculos, posto que, de acordo com a avaliação de Foucault, uma das grandes funções da filosofia moderna (sobretudo a partir do final do século XVIII) consistirá na interrogação sobre a própria atualidade.

É no mesmo sentido que, para Foucault, Kant retoma, mais de dez anos depois da publicação do opúsculo sobre o Esclarecimento, a pergunta pelo sentido do acontecimento revolucionário de 1789, como ocasião para problematizar o presente. Trata-se, dessa vez, de um texto publicado em 1794[29], escrito na mesma chave que empregara quando empreendera a decifração da Aufklärung como evento constitutivo da modernidade. De acordo com a interpretação de Michel Foucault, em O conflito das faculdades, a pergunta pelo sentido de um acontecimento do presente não pode ser obtido simplesmente através da interpretação da “trama teleológica que torna possível um progresso; é necessário isolar, no interior da história, um evento que terá valor de signo”[30].

Para que tal tarefa possa ser levada a efeito, como veremos logo em seguida, a indicação e decifração desse elemento portando valor simbólico somente pode ser realizada por alguém que se insere a si mesmo na questão, cuja resposta procura. Eis por que, segundo a interpretação de Foucault, Kant formula sua tarefa com o cuidado e a prudência convenientes: não se trata de uma exaltada e extravagante exigência de comprovar empiricamente a existência de uma disposição moral do gênero humano. Mesmo porque o sistema critico invalida, no domínio de questões éticas, a própria pretensão a esse gênero de comprovação. A tarefa só pode consistir, portanto, em circunscrever, na experiência e na atualidade, um signo sensível – ou seja, um sinal cuja presença seja historicamente identificável, e que ao mesmo tempo possa fazer remissão a uma causa que explique o sentido da história do gênero humano como um progresso moral infinito.

Essa questão pode ser formulada nos seguintes termos: seria o progresso moral infinito o sentido da história do gênero humano, considerado não apenas singulorum (ou seja, tomando-se isoladamente uma de suas partes), mas, como o afirma Kant, também segundo o todo da humanidade (universorum)- isto é, entendida esta última como sendo o gênero humano distribuído socialmente sobre a superfície da Terra na forma de comunidades políticas?

Para que o progresso infinito pudesse ser razoavelmente admitido como constituindo esse sentido totalizador, seria necessário reconhecer uma causa que fosse determinante do próprio curso da história. Por essa razão, torna-se necessário indicar quais seriam os sinais, constatáveis no presente, que poderiam revelar e atestar a existência dessa causa permanente (uma Anlage, ou disposição) que atuasse como promotora do aperfeiçoamento do gênero humano? Onde poderíamos discernir as marcas de sua efetividade?

Como isolar e reconhecer um evento no presente que permitisse decidir se existe essa causa, que deve persistir como atuante, tanto no passado como no presente e, prospectivamente, permitindo endossar nossas esperanças no futuro? É aqui que e apresentam toda a riqueza e a complexidade da problemática do direito . Será a ideia de uma sociedade cosmopolita organizada sob a égide deu a perfeita constituição jurídica republicana – como realização integral d conceito racional do direito – que apresentará o fio condutor para a de coberta de um sentido a priori para a história humana.

De acordo com Foucault, é nessa c ave que se deve interpretar o conflito – figurado por Kant – entre as faculdades de Filosofia e de Direito. Nessa disputa, o objeto em questão seria justamente essa vertente do conceito racional do direito, na medida em que a concreção empírica da ideia da liberdade sob leis universais auto-outorgadas – na figura de uma perfeita constituição jurídica republicana – apresenta-se como o eixo de uma reflexão a priori, que permite conferir realidade objetiva a juízos de natureza moral, tendo como objeto o sentido da história humana.

Ao fio condutor dessa ideia, a reflexão não tem de se limitar ao âmbito da constituição jurídica de um povo organizado em estado nacional, mas pode legitimamente alargar-se, para incluir o âmbito do direito das gentes e, no limite, de uma sociedade cosmopolita fundada no direito, racionalmente compreendida como meta e caminho que conduz à realização integral das disposições naturais do homem para o bem.

Caso não fosse assim, teríamos de nos contentar com a resposta dos jurisconsultos (portanto dos representantes da faculdade de Direito, no conflito das faculdades), que só pode dar conta daquilo que é de direito (de juris), mas não do que é o direito (jus), a saber seu conceito a priori. A resposta à pergunta pelo conceito racional do direito exige o concurso de uma disposição moral da humanidade, enquanto pertencente ao gênero de seres racionais, e ultrapassa necessariamente o plano empírico das legislações positivas. Explicitar a necessidade desse concurso constitui a parte desempenhada na disputa pela faculdade de Filosofia.

Desse modo, a atestação filosófica da disposição natural para o Bem, no gênero humano, exige, como uma espécie de corolário, a tese do progresso moral infinito como sentido da história humana. Somente com isso estariam derrogadas as hipóteses terroristas e abderíticas de interpretação da história, pois se a marcha da história tivesse a configuração circular, então a humanidade permaneceria numa repetição cíclica de ascensão e decadência, ou então o vetor de sua marcha seria indicado pelo pior – por uma catástrofe final que a tudo aniquilaria.

Com essa hipótese de uma loucura circular, ou de terrorismo histórico, restaria revogada toda interpretação otimista da história, no sentido de aventura de autoconstituição da humanidade como um todo moral; talvez então, no interior daquelas alternativas de compreensão, pudesse ter cabimento uma resposta de tipo empírico, como a que podem oferecer os jurisconsultos, para a realidade objetiva da ideia do direito.

Para Foucault, entretanto, o que Kant parece querer sugerir é que o modo de resolução da disputa entre as duas faculdades depende de uma história antecipatória do futuro da humanidade. Não podendo ela ser uma profecia sobrenaturalmente inspirada – na medida em que se trata de uma tarefa a ser cumprida pela razão filosófica-, essa história antecipatória só seria possível no caso do próprio historiador tomar parte nela e, por assim dizer, fazê-la, ao mesmo tempo em que a antecipa, ao empreender sua escritura.

Temos aqui, pois, do ponto de vista da interpretação de Foucault, um importante segmento a unir os dois textos separados por uma década de distância: repete-se, no plano das relações entre o direito e a história, aquilo que já se apresentara como tese, no texto sobre o Esclarecimento: somente um Aufklärer pode responder à pergunta pela Aufklärung, entendida como signo distintivo da modernidade.

De modo análogo, pode-se dizer que somente aquele que toma parte nesse acontecimento do presente – que justamente se trata de identificar como portador de um signo do progresso moral da humanidade – pode apreendê-lo pela reflexão e decifrar o seu sentido, na medida em que também toma distância reflexiva em relação a ele. Assim, é novamente a filosofia que se coloca em questão, como prática discursiva, quando toma sua atualidade e seu presente como objeto de problematização. Nesse sentido, esses textos de Kant poderiam ser entendidos como uma espécie de Esclarecimento do Esclarecimento, em que o próprio filósofo ascende à consciência de si mesmo pela resposta que dá à pergunta pelo presente. A genealogia do presente constitui, ao mesmo tempo, a ontologia de si mesmo.

Quando se trata de identificar um evento no presente que seja denotativo de uma causa atestatória do progresso moral da humanidade, causalidade que determina o sentido de sua história, Kant tem de tomá-lo como extensível às três dimensões da temporalidade. Portanto, exige-se nada menos do que um signum rememorativum, prospectivum, pronosticum.

É preciso que seja um signo que mostre que isso sempre foi assim (é o signo rememorativo), que enfim mostre que as coisas se passam atualmente assim (é o demonstrativo), que mostre enfim que isso permanecerá assim (signo prognóstico). É assim que poderemos estar seguros de que a causa que torna possível o progresso não agiu simplesmente num momento dado, mas que ela garante uma tendência geral do espírito humano em sua totalidade para marchar no sentido do progresso. Eis a questão: existe à nossa volta um evento que seria rememorativo, demonstrativo e prognóstico de um progresso permanente que envolve o gênero humano em sua totalidade?[31]

A saber, a pergunta se dirige para uma causa que atuou no passado, que continua a produzir efeitos no presente e que assim será também no futuro. Simetricamente à exigência já contida no texto sobre a Aufklärung, a tarefa requer a participação do próprio pensador no processo cujo desenrolar futuro ele apresenta como profecia filosófica. Também nesse caso, o diagnóstico perfaz uma genealogia do presente, uma decifração do sentido do tempo e do lugar de onde profetizamos.

Por isso, do ponto de vista de Foucault, o evento com valor de signo não pode ser o fato bruto e ruidoso da reviravolta dos impérios, as grandes catástrofes pelas quais perecem os Estados mais firmemente estabelecidos, as reviravoltas da fortuna que derrubam potestades consolidadas e fazem surgir outras novas em seu lugar, enfim, revolução, sob o aspecto de reviravolta em grande estilo das estruturas da sociedade e do Estado.

Pouco importa, diz ele (Kant), se a revolução de um povo pleno de espírito, que vimos se efetuar em nossos dias (trata-se, portanto, da Revolução Francesa), pouco importa se ela triunfa ou fracassa, pouco importa se ela acumula miséria e atrocidade, se ela as acumula a ponto de que, se um homem sensato a refizesse com a esperança de levá-la a bom termo, ele, entretanto, jamais se resolveria a tentar a experiência a esse preço[32].

Paradoxalmente, o essencial se passa no nível do modo que a Revolução faz espetáculo, a maneira pela qual é acolhida, por toda parte ao seu redor, pelos espectadores que dela não participam, mas que olham e assistem ao desenrolar dos acontecimentos, que se deixam arrebatar por ela. O significativo não é o sucesso ou o fracasso do processo revolucionário, mas a afecção moral por ela despertada no ânimo daqueles que não são seus atores diretos.

Aquilo que faz sentido e constitui o signo do progresso é que há, em torno da Revolução, uma simpatia de aspiração que beira o entusiasmo: aquilo que se passa na cabeça daqueles que não a fazem, ou, em todo caso, que não são seus protagonistas principais – a relação de participação que eles mantêm com essa revolução de que não são os protagonistas efetivos.

O entusiasmo pela Revolução é o signo, segundo Kant, de uma disposição moral da humanidade; essa disposição se manifesta permanentemente de duas maneiras: primeiramente no direito de todos os povos de dar-se a si próprios a constituição política que lhes convém e, em princípio, conforme ao direito e à moral de uma constituição política tal que evite, em razão desses mesmos princípios, a guerra ofensiva. Ora, é certamente a disposição levando a humanidade em direção de uma tal constituição que é significada pela Revolução. A Revolução como espetáculo, e não como gesticulação, como foyer do entusiasmo para aqueles que a assistem, e não como princípio de revi ravolta para aqueles que dela participam, é um signum rememorativum, pois ela revela essa disposição presente desde a origem; é um signum demonstrativum, porque ela mostra a eficácia presente dessa disposição, e é também um signum pronosticum, pois se há resultados da Revolução que podem ser postos em questão, não se pode esquecer a disposição que se revelou por meio dela[33].

Teilnahme – tomar parte, tomar partido, compartilhar, ser coafetado por um mesmo afeto, qual seja, o entusiasmo pela causa da Revolução e pela ideia de direito que ela encerra. Trata-se, pois, de um acontecimento cujo efeito é de natureza fundamentalmente estética. O que esse acontecimento parece problematizar, de acordo com a leitura de Foucault, é uma estética sui generis dos efeitos da Revolução. Qual, porém, é o autêntico objeto mobilizador do compartilhamento afetivo? Por que sentem os espectadores o mesmo que sentiam os revolucionários, mesmo não sendo os agentes dos eventos ruidosos que levam à reviravolta completa da soberania instituída?

Trata-se do entusiasmo pela constituição auto-outorgada, que proscreve a guerra ofensiva. Embora isso não esteja em Foucault, creio que se poderia, a justo título, afirmar no mesmo espírito de seu texto: trata-se aqui do entusiasmo pela ideia do direito compreendida em seu papel de legislação autônoma, sob a qual a liberdade de cada um pode conviver com a liberdade de todos sob a égide de uma lei universal autoinstituída, também no plano do direito das gentes e do direito cosmopolita. Eis o que pode significar uma constituição política perfeitamente republicana como base de uma ordem jurídica em que se realize na efetividade a autoridade universal da lei.

É, pois, nesse sentido que, para Foucault, a Revolução se apresenta como o prosseguimento e o acabamento da Aufklärung, de modo que ambos podem ser vistos como os eventos propriamente significativos da modernidade – como os dois eventos que não podem cair no esquecimento. A existência da Revolução atesta uma virtualidade permanente, que não pode mais ser esquecida: para a história futura, é uma garantia de continuidade de uma démarche em direção ao progresso.

Para Foucault, O que é Aufklärung? e O que é a Revolução? são as duas formas pelas quais Kant formulou a questão de sua própria atualidade. Nessas duas questões tem origem um processo de reflexão que não cessou de assediar a filosofia moderna desde o século XIX. O estatuto filosófico da Aufklärung – já que isso é, precisamente, o que se encontra em questão – consiste num processo permanente que se manifesta na história da Razão, no desenvolvimento e instauração de formas de racionalidade e de técnica, de autonomia e autoridade do saber, de modo que, nesse duplo sentido, ela não pode mais ser, para a consciência filosófica, apenas um episódio da história das ideias.

Para Foucault, como resultado final desse seu Un cours inedit, não se trata de preservar intactos os restos da Aufklärung, mas é preciso manter presente e guardar para o espírito aquilo que, nela, deve e merece ser pensado: a própria questão colocada por esse evento e por seu sentido, a saber: “a questão da historicidade do universal”[34].

Aqui se coloca, pois, a partir desse efeito estético da Revolução sobre o sentimento, a questão da Razão como problema histórico: sob a forma da Revolução, enquanto efeito e realização da Aufklärung, tomada como ruptura, reviravolta e fracasso e, ao mesmo tempo, como signo de uma disposição para o progresso operando na história. Aqui é que se coloca, para a posteridade, o problema de se saber o que é preciso fazer dessa vontade de revolução, que vem à luz, no mundo empírico, sob a forma do sentimento de entusiasmo pela ideia da constituição jurídica auto-outorgada, que proíbe a guerra ofensiva.

Para Foucault, essas questões definem o campo da interrogação que incide sobre aquilo que nós próprios somos, em nossa atualidade, ou seja, oferecem a direção inicial para as duas tradições críticas em que se partilhou a filosofia moderna: a obra crítica de Kant formula a questão das condições mediante as quais um conhecimento verdadeiro é possível. E, com isso, institui uma analítica da verdade, como programa da filosofia moderna a partir do século XIX.

Por outro lado, O que é Aufklärung? e O que é a Revolução? colocam o problema filosófico de o que seja a atualidade, de qual seria o campo atual das experiências práticas possíveis. Em ambos os casos, estamos em face de uma genealogia da atualidade e de uma ontologia do presente, de uma ontologia de nós mesmos, como diz Foucault.

Em certa ocasião, em resposta a uma pergunta do filósofo italiano Paolo Caruso sobre o sentido de seu trabalho, Michel Foucault declarou:

É muito bem possível que meu trabalho tenha algo a ver com filosofia: sobretudo porque à filosofia – pelo menos desde Nietzsche – compete a tarefa do diagnosticar, e não mais a de buscar dizer uma verdade que seja válida para todos os tempos. Eu procuro justamente diagnosticar: diagnosticar o presente. Eu procuro dizer aquilo que nós somos hoje, e o que é que agora significa dizer aquilo que nós dizemos. Este escavar sob os próprios pés caracteriza, desde Nietzsche, o moderno pensar, e nesse sentido eu posso me designar como filósofo[35].

Notas

  1. Mittelhochdeutsch: alto-alemão médio, ou seja, o idioma alemão não dialetal (Hochdeutsch) entre o período antigo e contemporâneo de sua história. 
  2. Cf. Martin Heidegger, “Die Metaphysik ais Geschichte des Seins”, Nietzsche, 2 Bãnde, Píullingen: Ver­ lag Günther Neske, 1961, v. 11, pp. 399-458. 
  3. Martin Heidegger, “Entwürfe zur Geschichte des Seins ais Metaphysik'”‘, Nietzsche, 2 Bãnde, Píullingen: Verlag Günther Neske, 1961, v. n, p. 458. 
  4. Lorenz Puntel, Sein und Gott, Tübingen: Mohr Siebeck, 2010, p. 85. 
  5. Martin Heidegger, Aquestão da técnica, trad. Marco Aurélio Werle, Cadernos de Tradução n. 2, São Paulo: Departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo, 1997, p. 57. 
  6. Martin Heidegger, A questão da técnica, op. cit., pp. 57-59. 
  7. Martin Heidegger, Die Frage nach der Technik, 5ª ed., Pfullingen: Neske Verlag, 1982, p. 16. A tradução dessa passagem é de minha responsabilidade. 
  8. Martin Heidegger, A questão da técnica, op. cit., p. 65. 
  9. Martin Heidegger, “Carta sobre o humanismo”, trad. Ernildo Stein, Conferências escritos filosóficos, São Paulo: Abril Cultural, 1973, p. 361 (Coleção Os Pensadores). 
  10. Apud Reinhart Maurer, “O que existe de propriamente escandaloso na filosofia da técnica de Heidegger”, trad. Oswaldo Giacoia Junior, Natureza Humana, v. II, n. 2, 2000, p. 406. 
  11. Martin Heidegger, “Sobre o humanismo”, trad. Ernildo Stein, Obras escolhidas, São Paulo: Abril Cultural, 1973, p. 351 (Coleção Os Pensadores). 
  12. Idem, ibidem. 
  13. Martin Heidegger, Gelassenheit, Pfullingen: Verlag Günther Neske, 1992, p. 19. 
  14. Martin Heidegger, Gelassenheit, op. cit., p. 20s. 
  15. Martin Heidegger, “Sobre o humanismo”, trad. Ernildo Stein, Obras escolhidas, São Paulo: Abril Cultural, 1973, p. 347 (Coleção Os Pensadores). 
  16. Martin Heidegger, Die Frage nach der Technik, 5. ed., Ffullingen: Neske Verlag, 1982, p. 28. 
  17. Martin Heidegger, Gelassenheit, op. cit., p. 26. 
  18. Gilles Barbedette e André Scala, “Entrevista com Michel Foucault”, Les Nouvelles, 29 maio 1984. Michel Foucault (1926-1984) – O Dossier – últimas entrevistas, Rio de Janeiro: Taurus, 1984. 
  19. Friedrich Nietzsche, Assim falou Zaratustra, parte II: “A hora mais quieta”, trad. Paulo César de Souza, São Paulo: Companhia das Letras, 2011, p. 140. 
  20. Friedrich Nietzsche, Além do bem e do mal, parágrafo 285, trad. Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras, 2005, p. 174. 
  21. Michel Foucault, Dits et écrits III (1976-1979), Paris: Gallimard, 1994, p. 623. 
  22. Idem, ibidem. 
  23. Michel Foucault, A arqueologia do saber, trad. Luis Felipe Baeta Neves, Petrópolis: Vozes, 1972, p. 162. 
  24. Idem, ibidem. 
  25. Idem, ibidem. p. 26s. 
  26. Cf. Immanuel Kant, “Beantwortung der Frage: Was ist Aufklärung?” (1784), Werke, Wilhelm Weischedel (ed.), Frankfurt/M: Insel Verlag, 1964, Band VI, pp. 52-61 (A48l-A494). 
  27. Idem. ibidem, p. 35. 
  28. Idem, ibidem, 1481, p. 53. 
  29. Cf. Immanuel Kant, “Der Srreit der Fakultaten”, Werke, Wilhelm Weischedel (ed.), Frankfurt/M: Insel Verlag, 1964, Band VI, pp. 267-393 (A V- A205). 
  30. Idem, ibidem, p. 37. 
  31. Idem, ibidem. 
  32. Idem, ibidem, p. 38. 
  33. Idem, ibidem. 
  34. Idem, ibidem, p. 39. 
  35. Paolo Caruso, “Gesprach mit Michel Foucault”, Von der Subversion des Wissens. Frankfurt/M: Fischer Taschenbuch Verlag, 1987, p. 12. (ConversazioneconM. Foncault. Milano: U. Mursia&:Cia, 1969). 

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