1991

Alfabetização, leitura e sociedade de massa

por Silviano Santiago

Resumo

A distinção entre espetáculo (manifestação legítima da cultura) e simulacro (entretenimento da indústria cultural) ajuda a melhor compreender o universo simbólico e cultural de hoje. Porém tal distinção traz em si uma estratégia de avaliação negativa da pós-modernidade pois classifica o espetáculo (que se dá em museus, salas de teatro, de concerto etc.) como forma autêntica da cultura e desclassifica o simulacro (que se dá sobretudo pela televisão) produzido pela indústria cultural, além de qualificar os meios de comunicação de massa como principais responsáveis pelo aviltamento da vida pública.

Nos países avançados o jogo entre espetáculo e simulacro, se não tem como vencedor o espetáculo, termina certamente por um empate. Bibliotecas, museus, salas de teatro, de concerto, competem — e convivem — com a televisão. Existe público pagante para o espetáculo e existe um grande público não privilegiado (economicamente, geograficamente, culturalmente etc.) para a retransmissão pela TV desse espetáculo.

Por aqui, a disputa entre espetáculo e simulacro, entre modernidade cultural e sociedade de massa começa e passa pela discussão em torno do consumo extremamente restrito do produto literário (o livro) pelo mercado brasileiro. Antonio Candido, em ensaio de 1973, discutia a relação entre literatura e subdesenvolvimento e chamava a atenção para o fato de que nos países latino-americanos se criava uma “condição negativa prévia” para a fruição de obras literárias — essa condição era o número restrito de alfabetizados. O escritor moderno, da periferia subdesenvolvida, estava fadado a ser “um produtor para minorias”. Examinando de maneira simples a constatação de Candido, chegaríamos a uma solução de que bastava que se alfabetizassem os brasileiros para que a situação artística se modificasse.

Na análise de Candido, qualquer processo de alfabetização fonética encontrará, nos países da periferia subdesenvolvida, um inimigo voraz e feroz, a cultura massificada, responsável, por sua vez, por uma “catequese às avessas”, segundo a expressão do crítico. Candido viu nos meios de comunicação de massa o grande inimigo a ser combatido pelos educadores e intelectuais. Além disso, considerava os valores tradicionais impostos pela arte e pela literatura eruditas como os únicos a serem preservados.

Entretanto, o processo de alfabetização era o caminho real da emancipação quando o acesso ao saber moderno se dava basicamente pelo domínio que cada indivíduo deveria ter da escrita fonética. Com a entrada da televisão nos lares de alfabetizados e analfabetos, essa discussão perde o sentido.

Ademais, a tradição erudita tem considerado excelentes certos produtos culturais que fazem, cada vez menos, a distinção entre cultura erudita e pop. Os próprios artistas estão descobrindo novos modos de “ler” uma produção cultural que não se manifesta pela escrita.

Uma outra crítica aos pensadores modernos se encontra na confusão que fazem, na análise do fenômeno TV, entre o modo como o veículo está sendo usado pela indústria cultural estrangeira e brasileira e o veículo em si.  No caso dos meios de comunicação de massa, a confusão entre o que merece repúdio (o produto) e o que é mero instrumento de comunicação (o veículo).


A distinção entre espetáculo (manifestação legítima da cultura) e simulacro (entretenimento da indústria cultural) tornou-se corrente entre os analistas que se ancoram nos valores modernistas para a compreensão da pós-modernidade. Segundo eles, no campo da produção simbólica e da produção propriamente cultural, a pós-modernidade estaria se manifestando pela proliferação abusiva e avassaladora de imagens eletrônicas, de simulacros, e mais e mais estaria privilegiando-os. A distinção entre espetáculo e simulacro é correta e deve ser acatada, pois ajuda a melhor compreender o universo simbólico e cultural de hoje.

Como quer Fredric Jameson em “Pós-modernidade e sociedade de consumo”, o campo de experiência do homem atual se circunscreve às paredes da caverna de Platão: o sujeito pós-moderno já não fita diretamente, com seus próprios olhos, o mundo real à procura do referente, da coisa em si, mas é forçado a buscar as suas imagens mentais do mundo nas paredes do seu confinamento. Para ele, permanece a concepção triádica que temos do signo (significante, significado e referente). No entanto, em lugar de se privilegiar o referente, como acontece nas teorias clássicas e modernistas do realismo, afirma-se a onipresença da imagem, isto é, da cadeia significante. A realidade (se não for abusivo o uso desse conceito neste contexto) se dá a ver mais e mais em representações de representações, como querem ainda os teóricos da pós-modernidade.

A distinção entre espetáculo e simulacro é correta; no entanto, em mãos de teóricos modernos, traz em si uma estratégia de avaliação negativa da pós-modernidade, muitas vezes pouco discreta. Ela visa privilegiar o reino da experiência viva, in corpore, e desclassificar a experiência pela imagem, in absentia. Visa também classificar o espetáculo (que se dá em museus, salas de teatro, de concerto etc.) como forma autêntica da cultura e desclassificar o simulacro (que se dá sobretudo pela televisão) como arremedo bastardo produzido pela indústria cultural. O primeiro leva à reflexão e o outro serve para matar o tempo. Visa ainda e finalmente qualificar os meios de comunicação de massa como principais responsáveis pelo aviltamento da vida pública. Para os idealizadores da distinção e defensores do espetáculo está em jogo preservar a todo custo, numa sociedade que se quer democrática, a possibilidade de uma opinião pública, e esta só pode se dar plena numa crítica avassaladora dos meios de comunicação de massa que divulgam à exaustão imagens e mais imagens – simulacros – para o consumo indigesto das grandes massas.

Num país como o Brasil, culturalmente miserável, torna-se crucial o problema levantado pelo debate acima rapidamente caracterizado. Aqui, até mesmo o analfabetismo fonético não foi enfrentado na sua devida época, ou seja, em fins do século XIX. Euclides da Cunha pregou em vão, depois do “crime” de Canudos, a tarefa a ser cumprida pelo mestre-escola, refazendo o percurso destruidor das tropas militares. Nos países mais avançados, a questão existe e preocupa. Menos. Menos porque houve um processo de alfabetização fonética em massa ocorrido no século XIX e um subsequente processo de educação universitária, também em massa, feito a partir dos anos 60, processo este que redundou na revolução cultural dos anos 60/70. Esta teve como epicentros a Universidade de Berkeley (Califórnia) e a Sorbonne.

Nos países avançados o jogo entre espetáculo e simulacro, se não tem como vencedor o espetáculo, termina certamente por um empate. Bibliotecas, museus, salas de teatro, de concerto, competem — e mais importante: convivem — com a televisão. Existe público pagante para o espetáculo caríssimo da encenação de uma grande ópera e existe um grande público não privilegiado (economicamente, geograficamente, culturalmente etc.) para a retransmissão pela TV desse espetáculo. Certos “espetáculos” já nem existem como tal, já surgem como simulacros (isto é, produzidos só para a transmissão eletrônica).

No Brasil, a disputa entre espetáculo e simulacro, entre modernidade cultural e sociedade de massa, já tem a sua história. Começa e passa pela discussão em torno do consumo extremamente restrito do produto literário (o livro) pelo mercado brasileiro. Antonio Candido, em ensaio de 1973, publicado em plena ditadura militar e em época de Mobral, discutia a relação entre literatura e subdesenvolvimento e chamava a atenção para o fato de que nos países latino-americanos se criava uma “condição negativa prévia” para a fruição de obras literárias — essa condição era o número restrito de alfabetizados. O escritor moderno, da periferia subdesenvolvida, estava fadado a ser “um produtor para minorias”, já que as grandes massas estavam “mergulhadas numa etapa folclórica de comunicação oral”. Entre parênteses, lembre-se que, para os pensadores do Iluminismo, o acesso à obra de arte e a subsequente fruição dela significavam um estágio superior no processo de emancipação do indivíduo.

Examinando de maneira simples a constatação de Candido, chegaríamos a uma solução também simples: bastava que se alfabetizassem os brasileiros para que a situação artística se modificasse e para que, em primeira instância, se emancipasse o cidadão. Já em 1973 o argumento era falacioso para Candido, pois havia uma grave e para ele danosa interferência dos meios de comunicação de massa na relação entre produção cultural erudita e seu possível público alfabetizado. Dizia ele: “Quando alfabetizadas e absorvidas pelo processo de urbanização, [as grandes massas] passam para o domínio do rádio, da televisão, da história em quadrinhos, constituindo a base de uma cultura de massa”. E conclui: “Daí a alfabetização não aumentar proporcionalmente o número de leitores da literatura, como a concebemos aqui, mas atirar os alfabetizados, junto com os analfabetos, diretamente da fase folclórica para essa espécie de folclore urbano que é a cultura massificada”.

Em outras palavras: a massa de alfabetizados recentes e de analfabetos continuaria a passar ao largo do livro e da cultura erudita e se encontraria diante do aparelho aceso da TV. Para o aprimoramento social do brasileiro era pouco ou nada eficaz a máquina milionária de alfabetização fonética montada pelo Mobral — eis a mensagem cifrada do artigo em 1973.

A conclusão de Candido é constrangedora e aflitiva: qualquer processo de alfabetização fonética encontrará, nos países da periferia subdesenvolvida, um inimigo voraz e feroz, a cultura massificada, responsável, por sua vez, por uma “catequese às avessas”, segundo a expressão do crítico. Se a catequese jesuítica, a primeira, se valia do espetáculo do teatro para converter índios e negros, esta segunda catequese se vale dos simulacros produzidos pelos veículos de comunicação de massa. Estes chegam “até à inculcação subliminar, impondo valores duvidosos e bem diferentes dos que o homem culto busca na arte e na literatura”.

Repitamos: era uma catequese “às avessas” e portanto bem menos positiva do que a sua antecessora na época colonial. A primeira tinha um fim básico e altamente positivo: preparar o índio e o negro para o acesso ao melhor do pensamento cristão e erudito europeu. A segunda catequese joga de volta a massa pobre dos brasileiros à barbárie do mundo.

Candido, como bom pensador modernista, via (1) os meios de comunicação de massa como o grande inimigo a ser combatido pelos educadores e intelectuais e (2) os valores tradicionais impostos pela arte e pela literatura eruditas como os únicos a serem preservados, apesar de as condições econômicas, sociais e políticas do mundo e do país indicarem um caminho outro e mais ricamente pavimentado. Cabia, pois, aos defensores da arte e da literatura eruditas uma tarefa inglória: resistir à invasão milionária e alienante dos meios de comunicação de massa.

Vamos a uma primeira crítica a essa atitude. Não ocorreu aos defensores dos valores da Ilustração uma reflexão um pouco mais devastadora: o processo de alfabetização, tal como configurado por eles, era o caminho real da emancipação há um século, quando o acesso ao saber moderno se dava basicamente pelo domínio que cada indivíduo deveria ter da escrita fonética. Em pleno século XIX e ainda em começos deste século, sem o livro e sem o jornal não se tinha acesso ao mínimo de informação que poderia conduzir ao conhecimento da complexidade do acervo humano e dos fatos históricos e atuais. As coisas começaram a mudar de figura com o jornal cinematográfico, mudaram mais ainda com o gênero “documentário” (basta que se analise a importância desse tipo de filme na Inglaterra dos anos 30 e do nosso Alberto Cavalcânti), mudaram definitivamente com a entrada maciça da televisão nos lares de alfabetizados e analfabetizados. Isso sem mencionar o que pode advir de conhecimento da leitura propriamente dita da produção ficcional veiculada por esses meios de comunicação.

Acatada essa primeira crítica, coloca-se uma dupla tarefa para os analistas da nossa sociedade atual. Trata-se de repensar o que se deve entender por “alfabetização” numa sociedade de massa que não passou pela alfabetização fonética na sua devida época e que, por isso também, perdeu a educação universitária na sua década gloriosa. Trata-se, em seguida, de saber o que se deve entender por “leitura” hoje.

Em outras palavras: um homem de boa vontade hoje, um cidadão, mesmo analfabeto, tem uma quantidade de informação que ultrapassa e muito a informação que tinha um homem de boa vontade, um cidadão, mesmo alfabetizado, há meio século. O grave problema é o de saber como transformar a quantidade de informação em conhecimento, como conduzir um cidadão a incorporá-la qualitativamente para que dela se possa valer na sua compreensão da sociedade e do mundo em que vive. Já sabemos que nos países periféricos não será pela simples e espinhosa alfabetização fonética.

A segunda crítica decorre da primeira e insiste numa contradição encontrada no próprio campo da avaliação da produção artística contemporânea. A tradição erudita (isto é, a que vela pela difusão das obras de arte que se dão como únicas ou então pelas que se valem da escrita fonética) tem considerado excelentes certos produtos culturais das duas últimas décadas que menos e menos fazem a distinção entre cultura erudita e pop. Um exemplo: torna-se impossível para o leitor captar com correção a obra ficcional de um Manuel Puig se não estiver familiarizado com a novela radiofônica (Boquitas pintadas) ou com os filmes hollywoodianos chamados B (O beijo da mulher-aranha). Como diz Jameson, fica “cada vez mais difícil discernir a linha entre arte erudita e arte comercial”. Portanto, os próprios artistas estão investindo a sua imaginação criadora em outros e novos campos, isto é, estão descobrindo novos modos de “ler” uma produção cultural que não se manifesta pela escrita, como a indicar que existe na disseminação massificada de simulacros um universo a ser investigado para que se tenha uma visão de mundo que finca pé na atualidade. Eles estão como que a dizer aos seus leitores: vejam como eu tive de aperfeiçoar outras formas de “leitura” para ser contemporâneo, por que vocês não tentam também? Há que se ter menos preconceito para com as formas pop de produção artística.

Uma terceira crítica aos pensadores Modernos se encontra na confusão que fazem, na análise do fenômeno TV, entre o modo como o veículo está sendo usado pela indústria cultural estrangeira e brasileira e o veículo em si. Há nesse tipo de confusão uma forma velada de obscurantismo, preconceito contra os avanços tecnológicos: é como se fôssemos contra o avião porque foi ele que possibilitou jogar a bomba atômica em Hiroshima. O que merece nossa total e irrestrita desaprovação é a bomba atômica e o fato de a bomba ter sido usada contra uma população civil. O avião é um veículo que pode, por outro lado, ser usado para socorrer mais rapidamente as vítimas de um acidente.

No caso dos meios de comunicação de massa, a confusão entre o que merece repúdio (o produto) e o que é mero instrumento de comunicação (o veículo) advém do fato de que, ao se analisar e privilegiar o modo de produção da mercadoria cultural e não o modo de produção da recepção daquela mercadoria, desclassifica-se a priori o veículo quando a má qualidade pode se referir (e muitas vezes é o caso) apenas ao produto. Mais importante e desolador: ao se desclassificar o produto, desclassifica-se também e a priori o “leitor”. Os teóricos modernos estão sempre a dizer que só um espectador de quinta categoria, um analfabeto fonético, pode interessar-se por aquele tipo de produto. Veículo, produtor, produto e espectador ficam restritos ao gueto da má qualidade, parte que são todos de um mesmo sistema visto e encarado em total pessimismo pelos críticos modernos.

Da confusão entre veículo e produto, estabelecida a partir da compreensão exclusiva do modo de produção, conclui-se que o simulacro nada mais é do que parte diabólica de um sistema que, por contágio, se torna também diabólico. Vacilou, dançou — reza o dito popular.

Tomemos, como exemplo de confusão, o caso de uma missa solene (espetáculo) e a sua retransmissão pela televisão (simulacro). Se se enfatiza o modo como é produzido o simulacro dela, veremos uma equipe de técnicos que com equipamentos e luz transtornam a visão do espetáculo e com ruído e vozes impedem o fervor e a contrição dos fiéis. Mas, se se pensa no modo de recepção, pode-se detectar que muitos dos participantes in corpore pouco se interessam pelo espetáculo, pouco se integram a ele e ali estão em busca de status. Ao contrário, nada impede que uma população periférica e econômica e geograficamente desprivilegiada possa ter acesso, pelo simulacro, ao espetáculo de alguns poucos, participando de maneira verdadeiramente religiosa do santo sacrifício. Só o simulacro possibilita hoje uma experiência da pobreza, tomando a expressão em muitos sentidos, inclusive o que lhe é dado por Walter Benjamin.

Trata-se, primeiro, de colocar a tônica na possibilidade de aprimoramento do ato de leitura. Esta deve ser compreendida como uma atividade que transcende a experiência da escrita fonética. Deve-se buscar, na sociedade de massa, a maneira de aprimorar a produção de sentido do espetáculo e/ou do simulacro por parte de todo e qualquer cidadão. A produção de sentido deixa de ser feita apenas por grupos restritos e inegavelmente mais sofisticados. Por isso, não há um sentido único e autoritário dado pela configuração feita por um grupo legitimador (a crítica, como é o caso tradicionalmente). O sentido da produção simbólica e/ou cultural é plural e inalcançável na sua pluralidade. O sentido é produto de uma tensão que não é mais necessária e unicamente articulada pelas instituições do saber. Não se trata de questão teórica fácil de ser resolvida, sobretudo porque ainda nos situamos prazerosamente (ou ansiosamente) nas hermenêuticas da profundidade instituídas pela Modernidade. Contentemo-nos em apresentá-la para o debate, sugerindo que há necesidade de se repensar radicalmente o problema da avaliação do produto cultural na sociedade de massa.

Trata-se, em segundo lugar, de criticar a propaganda do atual governo que tem uma visão oitocentista de alfabetização. É impensável que se peça a um trabalhador e pai de família que todas as noites se informa (bem ou mal, esta é a mesma questão, mas por outro viés) tanto do que se passa em Brasília quanto em Berlim, tanto do que se passa em Moscou quanto no golfo Pérsico, é impensável que se peça a ele para que se alfabetize foneticamente a fim de se tornar um cidadão emancipado. Não se pode compará-lo com o futuro cidadão do final do século XIX. A alfabetização fonética em si e tal como estará sendo instrumentalizada pelo Ministério da Educação representará um atraso concreto para ele e não o acesso à cidadania. Vale dizer: será pura perda de tempo. É preciso buscar caminhos e meios para torná-lo um leitor mais consciente do seu universo simbólico e cultural, da sua parede na caverna de Platão. E nesta estão “impressos” tanto o telejornal quanto a novela, tanto a retransmissão de um concerto de música clássica quanto uma discussão por intelectuais numa televisão educativa.

Trata-se, em terceiro lugar, de se dar conta de que não adianta querer exigir dos produtores culturais de simulacro uma melhor qualidade a priori. Esta, caso dada a um público não preparado para recebê-la, não terá nenhuma repercussão. Fracasso de público, e estamos conversados. A melhoria da qualidade dos produtos culturais de massa não está em exigências autoritárias do Estado (mesmo o mais avançado politicamente) aos grupos que detêm o seu poder e não está também na transferência pelo Estado para o próprio Estado desse poder. Está na melhoria de qualidade do gosto dos espectadores, dos consumidores, e esta é a tarefa de uma Educação afinada com o seu tempo. Os espectadores, isto é, os novos “leitores”, mais ou menos “alfabetizados”, mais ou menos exigentes, é que passarão a definir os padrões de excelência, assim como no passado era o teste da crítica e da universidade que os definia. Aviso: não se trata de excluir crítica e universidade, mas de retirar-lhes o cetro de únicas avaliadoras.

Finalmente, todo crítico literário sabe que um mau livro pode ser objeto de uma boa leitura e sabe também que um bom livro pode ser objeto de uma leitura medíocre. Apenas críticos ranhetas insistem em que só os clássicos devem ser lidos. A discussão política dos anos 80 nos mostrou que os valores universais guardam fortes compromissos com centramentos étnicos, sociais, sexuais etc. A luta dos grupos minoritários pela busca da própria identidade passa necessariamente pela pesquisa e recuperação de objetos de cultura julgados inferiores pela tradição moderna a partir dos seus padrões centrados (considerados “objetivos”) de avaliação. O valor de um objeto cultural depende também do sentido que se lhe dá a partir de uma nova leitura, sobretudo se esta desconstrói leituras alicerçadas no solo do preconceito.

Espetáculo e simulacro são bons e ruins. Depende. Existem para a razão apaixonada do leitor-cidadão. Ou não.

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